28.6.08

Vodka com balas


O local: Hungria. O ano: 1939. E era eu ali, naquele bar. Um luxuoso e caro bar de Budapeste, cuja entrada remetia aos pórticos detalhados da Grécia antiga. Szimpla Kert era o nome do lugar e da bebida com vodka, marca registrada da Casa, que eu pedira, como na noite anterior. Sua penumbra e a fumaça embaçante dos cachimbos, por pouco não me deixam notar a entrada de Natasha Polansky, que veio direto ao balcão, onde me encontrava.

– Acho melhor irmos sentar no canto.

Disse-me sussurrando, num inglês carregado de sotaque, em um ouvido, após ter beijado a outra face. Obedeci de pronto. Afinal, havia um estado de pré-guerra por toda Europa, com os rumores da provável invasão dos alemães à Polônia.

Além do mais, como me dissera um dia atrás, seu marido era o comandante do batalhão húngaro que se deslocara para a fronteira com a Áustria a fim de garantir a reunião diplomática entre os líderes dos dois países, mas, que não sabia ao certo a data de seu regresso.

Hoje, diferentemente da véspera, Natasha vestia um tailleur vermelho com um decote encorajador, pouco comum às senhoras casadas da Europa Central de 39. Seus voluptuosos seios quase saltaram em minha direção quando puxei-lhe a cadeira...

Sabia que o que ela queria era vingança. Uma vingança reprimida pelo tipo de vida que levava e pela conduta do seu marido: milico-repressor, austero e pouco amável.

Sabedora de artes e literatura, naturalmente “boasuda”, como diriam mais tarde, dona de uma voz sexy e ao mesmo tempo doce, quase infantil... era daquelas mulheres que não teriam dificuldades em trair o marido bem debaixo do seu nariz, com quem ela quisesse. Mas, por que comigo?

Eu, brasileiro, recém chegado do Recife, em uma viagem demorada e perigosa de dirigível através do Atlântico. Sabia que aquele balão cheio de Hélio era altamente inflamável e que aqueles políticos que jogavam poker no andar inferior da aeronave não tiravam o charuto da boca. Busquei o primeiro drink, no primeiro bar aberto que encontrei, para aliviar a tensão da viagem e do clima de guerra que ouvi no rádio quando cheguei ao Hotel Manzard Panzio, no Centro.

Logo eu, meio intelectual, meio de esquerda, que agora, com trinta e poucos anos começava a dar sinais de uma calvície iminente.

Justamente eu, que me retirei para o Velho Continente em busca de paz e de um pouco de “Alzheimer”, na tentativa desesperada de esquecer Claudinha, ex-namorada, ex-noiva, ex-tudo que me trocou por Rui, meu ex-melhor amigo! (Essa é outra estória).

Já era tarde, ao longo da noite, a conversa se revelava picante e Nat (como já a chamava) deslizava, lentamente seus pés, já descalços por entre minha pele e meia. Eu, como que encantado pela situação, mas precavido, era um olho no decote e outro na porta! Já temendo por ter de fazer uma retirada a La James 007.

– Nat, que você acha de irmos ao meu Hot..?

Ela nem deixou eu terminar a frase. Jogou 50 Florentinus sobre a mesa e me arrastou pelo pórtico em direção a um Maybach 1938 verde-escuro estacionado à esquerda da rua. Pensei que fosse difícil encontrar mulheres dirigindo pela cidade, mas era muito comum, mais ainda quando a maioria dos militares estava em “missão” nos preparativos para a guerra ou para evitá-la. Alguém tinha que levar as crianças à escola, ou fazer as compras, não é?

Natasha não era das que esperavam, entramos no carro e passamos ao banco traseiro, onde, antes que eu percebesse, já não sabíamos qual mão era de quem? A adrenalina era tanta e a tesão a ultrapassava tanto, e o calor, e o desejo, que hora depois, nem notamos que havia chovido muito. Foi como se entrássemos num espaço-tempo contínuo e ardente.

Após o acontecido, ainda dentro do carro, como de costume adormeci nos braços da húngara, como fazia nos de Claudia, que, certamente não me esperava no Brasil... até que ouvi um som de destrave da porta do carro, e um disparo seco e estridente me fez levantar esfuziado com um braço da minha namorada me sacudindo e o outro baixando o volume da TV:


– Acorda garoto! Vamos devolver o filme amanhã cedo, e se você não o vir, terá que pagar outra locação!
Acordei e fui tomar um café para assistir ao restante de Patton!

P.S.: Patton: Rebelde ou Herói? (1970) – Francis Ford Coppola – excelente filme sobre a segunda guerra, apesar das omissões e cortes no roteiro. Ah... não dá sono, não!

2 comentários:

Anônimo disse...

Boa viagem, garoto! Se todos os sonhos fossem assim, seria bom lembrá-los ao acordar, não é?

Beijo!

Mack :)

Luci disse...

Ás!!!!!
já nos esbarramos tempos atrás... eu me lembro!
Patton - assisti no cinema, acredita?! sim, meu caro Ás, sou do século passado...rs!
não vou me perder de novo!
bj!
ps: e eu nem sou água - sou fogo!!!rs! mas é só fachada!